Quem disse que vacinas aceleram AIDS?

Relembrei de um caso de quatro anos atrás: uma live na qual Bolsonaro falou que pessoas vacinas contra Covid poderiam desenvolver AIDS mais rápido. O caso gerou enorme comoção. Somente agora me dei conta que, além de Bolsonaro, a Exame errou. E eu também. Vem comigo que explico:

Em 20/out/20, a Exame publicou um artigo que citava um estudo inglês que dizia que certas vacinas poderiam facilitar a infecção por HIV. Aparentemente, não gerou muito impacto à época.

Qual era esta matéria? Segundo Bolsonaro, era aquele artigo da Exame de out/20. Mas tinha um problema: nele não constava isto. O que dizia lá: “algumas vacinas que usam um adenovírus específico … podem aumentar o risco de que pacientes sejam infectados com HIV.”

De onde era então? Do Before It’s News, um repositório público de “notícias” no qual qualquer um pode publicar. Fala de ETs, illuminati, chemtrails e todas as teorias de conspiração malucas que você possa imaginar.

Para quem tem dúvidas, aqui está uma captura de tela da live mostrando a fonte que ele usou:

Ou seja, Bolsonaro confundiu um estudo que falava de maior facilidade de infecção por HIV (quando exposto a ele) com suposto desenvolvimento acelerado de AIDS. Coisas totalmente distintas.

Ironicamente, um das vacinas que tinha aquele risco potencial era a russa Sputnik, a que uniu bolsonaristas e petistas a seu favor (e que fora vetada pela Anvisa) – e nenhuma das vacinas usadas na vacinação no Brasil tinha o componente que aumentava o risco de infecção.

Mas onde a Exame errou? Em função da enorme publicidade gerada, em 25/out a Exame fez alterações na matéria: acrescentou um ponto de interrogação à manchete e incluiu este trecho aqui. Mudou o sentido? Não. Mas, a meu ver, uma edição deveria vir com uma explicação.

Isto foi suficiente para Bolsonaro, dias depois, dizer que a Exame tinha alterado o texto após a live, dando a entender que seria para prejudicá-lo. (ele ainda não percebera que o que prejudicava era usar um site conspiracionista como fonte).

E onde eu errei? Eu pensava que Bolsonaro mentira sobre a edição do artigo do Exame – mas diferente do que eu disse à época, realmente houve uma edição. Mas não mudava o sentido do texto original. Poderiam ter deixado do jeito que estava, pois a mentira de Bolsonaro já estava exposta.

Resumindo:

  • a Exame citou um estudo sério
  • Bolsonaro usou um site conspiracionista como fonte
  • Bolsonaro incorretamente citou a Exame como fonte
  • a Exame adicionou uma frase à matéria após a live
  • Bolsonaro acusou a Exame de alterar o conteúdo
  • eu achei que a Exame não tinha editado o texto

Em suma, o que a Exame fez não foi um erro bombástico – foi mais um timing inadequado (e sem explicação) que serviu para bolsonaristas inferirem que foi para prejudicar o mito. De qualquer forma: Bolsonaro usava qualquer coisa (qualquer coisa MESMO) para jogar dúvida sobre a segurança das vacinas – algo inaudito no mundo inteiro.

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