Resenha: Sapiens, de Yuval Noah Harari

Eu devia ser um dos últimos Homo sapiens a não ler o Sapiens do Harari – e eis aqui uma resenha.

Importante: é uma visão pessoal e subjetiva, não levem a ferro e fogo (até porque depois fiquei sabendo que o livro tem tanto amantes quanto detratores).

Antes de tudo, a única coisa que eu sabia a respeito dele é que ele vendeu muito, mas não fui atrás de resenhas e opiniões de terceiros – o que me permitiu lê-lo sem ideias pré-concebidas e expectativas.

Desde o início, fica claro que é um livro voltado ao grande público, a escrita é de compreensão fácil e tem uma narrativa ágil. Outro ponto que me chamou a atenção é que a fonte de inspiração parece ter sido Cosmos, do Sagan – pelo título, tamanho, público-alvo e abrangência do tema.

Por eu ter vindo de um livro apinhado de citações (o maravilhoso The Invention of Science), Sapiens me deu desconforto por ter relativamente poucas citações bibliográficas. Há longos trechos com afirmações impactantes que não são referenciadas (e fiquei surpreso com esta tal lista online).

Algo que fica evidente no primeiro terço é um apreço e até alguma idealização de Harari quanto aos humanos primitivos, quando ainda viviam em bandos nômades. Imediatamente lembrei da Origem da Desigualdade Entre os Homens, de Rousseau, que igualmente idealiza o homem primitivo e relaciona a civilização ao início da decadência humana – sem apresentar evidências históricas (me pareceu mais um exercício mental).

Segundo Harari, humanos abandonaram formas de organização anteriores (bandos de caçadores-coletores) em favor de outras (assentamentos de agricultores) que supostamente reduziram a qualidade de vida. Como isto é anti-intuitivo, faltou se aprofundar na explicação do porquê de a humanidade optar em evoluir no sentido para pior – se é que a piora realmente ocorreu.

Nas referências (apenas online), vejam só, ele menciona que a mudança para uma sociedade agrícola é um tema polêmico e que outros autores defendem que ela trouxe bem-estar. Por que isto não foi mencionado no texto? Deixaria o livro muito mais rico.

A partir deste ponto eu passei a ler o livro com ressalvas (lembrando que até então eu não lera nenhuma resenha dele) e, apesar da escrita fácil e fluência, foi ficando menos interessante para mim (o que também fez cair o quanto eu lia por dia).

Na p. 250, ele diz que não há provas que o bem-estar humano inevitavelmente melhora ao longo da História – aí vemos que ele está num campo oposto ao do Steven Pinker, que enxerga um progresso positivo.

Por favor, não entendam que o livro não levanta pontos pertinentes: é apenas que por vezes o faz de forma um tanto freestyle, como mostro a seguir:

Na p. 277, ele diz que o principal projeto da Revolução Científica é dar à humanidade a vida eterna – apenas no achismo, sem referências de terceiros. 

Ele pouco se apegar à busca pela extensão dos anos saudáveis, que me parece algo facilmente defensável com base na literatura disponível – mas reitera que o fim é a extensão da vida total muito além dos limites atuais (coisa de centenas de anos).

Na página 343, ele afirma que um trabalhador africano ou indonésio volta para casa depois de um dia de trabalho com menos comida que seus ancestrais há 500 anos. Isto é bombástico! Mas onde está a evidência? Ele não a cita (nem nas fontes online – lá consta um coming soon).

Este é o tipo de detalhe que me incomoda demais: se você afirma algo tão impactante, espera-se que você saiba defender o seu ponto de maneira convincente – e não apenas dizer que é assim e pronto.  

Da página 390 em diante, ele fala sobre a felicidade no mundo moderno, de fatores que a influenciam e de quão difícil é medi-la. Tudo bem até aqui. Mas na sequência ele dá a entender que os humanos modernos são mais infelizes que os primitivos – o que contradiz o início. 

Ao final da leitura, algo que me chamou a atenção é que, diferente do citado Cosmos, de Carl Sagan, o Sapiens não transpira paixão e otimismo (características do Sagan) – mas sim algo de niilismo. 

Recomendo a leitura? Sinceramente, acho importante ter sua própria opinião a respeito deste tipo de livro que todo mundo leu – mas, por outro lado, se tiver outros desta categoria na sua lista a ler, eu colocaria os demais na frente.


E agora finalmente poderei dar início à leitura do The Book of Why – para este, sim, tenho uma expectativa altíssima, baseada em relatos que li antes (e me parece ser bem mais difícil). Espero não me decepcionar.


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